Olá

Bem vindo a partes de mim



sábado, 28 de novembro de 2015

Como pode
uma boca marcar
de forma tão suave
e tão profunda
a noite de alguém

indo já embora
teve um gelo que precisou molhar meu corpo
escorreu
molhando
salivando

salivando a boca de saudade
daquele beijo
com gosto de nunca mais

e justamente por teimosia
é que o nunca mais
pra mim
tem gosto de quero mais

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Adrina enche o ambiente com sua voz. Me ajudando a me pedir de volta de tu. Não é fácil, nem um pouco. Difícil te agarrar pra fora do peito que te acolheu tão bem. Abri as janelas, limpei as cortinas. Fiz café. Uma sobremesa, ao final. Te acolhi como quem guarda precioso regalo. Com quem sabe que as imperfeições e imperfeições fazem da pedra a joia. Do Pedro, a joia.
Não é simples te tirar. Como quem fez bom gosto da visita, mas nem por isso pretende morar, você se delonga a sair. Finge que vai e volta. Esquece de propósito um chapéu, as cuecas. As vezes um beijo. Qualquer coisa só pra voltar, tomar um café. Mas nunca ficar. Nunca tirar os sapatos.
Não deixa meu chão tocar teus pés, tem medo. Um medo tão seu que seria covardia minha atribuir culpa a mais alguém. Você o alimenta só. É você que o acoberta e incentiva. Você que o deixa crescer e enraizar no teu corpo. É você que tem medo de ser feliz e de ser mais - tanto que seus inspiradores te dizem o contrário...
E no discurso até fica bonito. Mas quem te conhece sabe. Não é capaz de aceitar amor bem dado.
Ou, simplesmente, não queira este amor. É uma possibilidade também. E das minhas teorias é que a mais me dói, justamente por não dizer nada, ser apenas o ponto fechado em sua própria crueldade. A verdade mais sem sonho que existe.
Todavia, esse texto era pra eu aprender a me despedir. Não o primeiro neste tom e provavelmente não será o último. Mas de vez em vez eu crio mais força e coragem. Te desapegar é difícil, me sinto quase que em remoção cirúrgica. Tudo para ter o cuidado de preservar meu peito ao te arrancar dele.
A obrigação já me chama há horas, e o café que fiz pensando em estudar se consome todo nessa nossa conversa paralela. Paralelas porque eu sei, assim como Belchior devia saber, que você também conversa comigo por aí, sozinho.
Grande parte da dor e do esforço de te deixar ir embora é dos meus sonhos que ainda tem alguma esperança te de fazer gostar da morada. Mas como eu mesma escrevi uns meses atrás "essa danada esperança/Sempre nos deixa esperando/sem avisar que nunca vai chegar". Talvez já seja hora de assumir a lição.
Pedro, que de tanto amor em mim tu só tenha bebido a rasa água daquela cachoeira em Bonito, é uma pena.
Mas acredito que agora eu vá ficando sem opções pra criar ilusões e me enganar. Talvez seja hora de encarar o fático destino. E te deixar ir. Não mais vale te prender aqui...
Seja livre pra seguir seu destino, com muita felicidade e carinho. Que flores nasçam no teu asfalto.
As cenas correm na minha mente. Blusa azul de frida no teu sofá. O melhor abraço já provado, com o encaixe feliz de almas que se abraçam. Vestido vermelho chorando no carro. Amor pela primeira vez dito como tal. Um adeus em frente ao bar. Uma mão no meu seio e uma boca que me chamava gostosa. Duas mãos dadas bebendo vinho. Por último, um beijo que me diz, de dentro do elevador, "vá procurar alguém que te mereça. Eu te amo, do meu jeito, mas amo."
Queria dizer que vou, imediatamente. Mas seria uma verdade pouco válida nessa altura do campeonato. Vou ja ja, daqui a pouco, mês que vem talvez. Ou no próximo ano que já se aproxima, me lembrando que faz um ano que nos conhecemos em breve.
Mas eu sei, eu sei. O talvez que disse há pouco aqui já não cabe. É hora de te deixar ir. Vá.
O café ficou frio. A voz mudou, agora foi pra Ana Carolina (tortura do destino). Mas vou te deixar ir. (A resistência de acabar o texto se assimila com o conteúdo dele).

Menino, te deixo ir. Embora te ame. Amo. Mas amor não configura posse. E, no caso, nem mais esperanças. Seja do mundo.


NÃO É AMOR


Nunca foi
Esse seu cheiro que me invade quando o vento toca o rosto
Não pode ser presságio de amor

E quando teus olhos
me lembram a imensidão do mundo
E me acalentam a alma
é só um suspiro,
mas amor não é

E minha boca
quando deseja a tua tal qual alimento
quando chama teu nome à noite
e geme
é só dialogando com o acaso

Minha pele
que se arrepia ao menor contato com a tua
só sente frio
porque amor não dá essas coisas

E meu peito, quando grita pelo teu
querendo que essas duas ondas se esbarrem
formando mar

Mar
que foi teu primeiro nome
Na nossa história
O mar
quando me lembra que existe amor
é só porque as ondas varrem a terra
e apagam qualquer rastro

Quando eu te amo
todas as vezes
que te amo
não são por amor

Não são e nem podem ser.

Se te quero,
quando quero
Não é amor. É precipício.
É o olhar no infinito
quando acaba o chão
e a gente se vê mundo.

terça-feira, 3 de novembro de 2015

NO DIA QUE ME DESCOBRI MULHER


Quando eu nasci
era tudo rosa
me disseram menina
e, sem querer
me deram nome que não tem sexo - tem flor


Quando eu cresci
não podia brigar
não podia subir em árvore
olha o fogãozinho!
fechas as pernas meninas
não se suja, isso é coisa de menino

Depois, aprendi a ser moça
Mulher difícil é que o homem gosta!
Aprendi a amar meu marido acima de tudo
e que quem ama, perdoa
(tudo)


Mas um dia,
por erro de cálculo
ou por falta de vigio
eu me descobri mulher.
Os dedos escorreram entre as pernas
eu descobri o prazer.
Os olhos viram nas outras, irmãs
eu descobri não estar só.
Os punhos se ergueram no ar
eu descobri como lutar.

Quando a gente descobre
qual o lugar que nos foi dado na sociedade
e que dele só servimos, algo muda.
Quando a gente descobrem que só nos calam por medo do nosso grito.
o pulmão enche de ar
Porque daqui, da minha luta
eu não estou só.
Eu estou mais forte,
eu caminho melhor.

No dia em que me descobri mulher
descobri que há um rasgo
no corpo, na alma
que me diz
em contra-grito ao resto do mundo:

floresce, menina




POESIA QUE SE COME CRUA

Eu sou poesia que se come crua!
Ora se ao passo que caminho no mundo
Me pedem cuidado
Enfeites
Mentiras

Se afastem:
que de mim nada escorre além da acidez da verdade

Se me corrigem o passo torto
e julgam errado meu caminho
Pedem menos cor
Tiram minha dor
Gritam para meu encolhimento

Fiquem logo sabendo: a minha poesia se come crua

Eu sou os versos que ganham vida nas mãos cansadas
A verdade que exala dos poros
Sou o que a gente diz quando falta palavra e só sobra o (arrrrrrrrr)

A minha poesia
não tem tempero
não é forjada no fogo
não se adapta
não foge à si

Minha verdade é para se comer crua!
Não me digam mentiras
Não esperem a obediência

Minha poesia, que nasce do céu e brota desse chão
É feita pra se comer crua - e que não venham os homens tirar minha cor
minha dor

Porque eu fui feita assim: crua, nua.